terça-feira, 26 de agosto de 2014

Orestes e o "Chão de estrelas"

Orestes Barbosa foi um menino pobre, que só aprendeu a ler  depois dos 12 nos e, adivinhem pelas mãos de quem? resposta: do pai de Vinícius de Moraes. Também seu primeiro mestre de violão.
Poeta, escritor, jornalista, Orestes deixou uma vasta produção cultural, inclusive livros que tratavam justamente do que mais apreciava fazer: música. Na vida música, que começou em meado dos anos 20, teve grandes parceiros, dentre os quais Francisco Alves, Noel Rosa e Sílvio Caldas, que foi seu parceiro em um de seus maiores sucessos, "Chão de estrelas". Nessa música, que meu pai gostava de cantar e tocar ao violão, segundo o poeta Manuel Bandeira, estão os mais belos versos de nossa música popular. Concordo plenamente com o poeta, mas acho que não somente os escolhidos por ele, mas toda a letra, pois Bandeira amava o verso "tu pisavas os astros, distraída", enquanto este pobre e modesto escriba é apaixonado por vários, repito, principalmente "a porta do barraco era sem trinco/mas a lua furando o nosso zinco/salpicava de estrelas nosso chão", é simplesmente maravilhoso, porque retrata (ou retratava) a realidade do morador do morro, que vivia realmente num barracão de zinco.
Acho que a mais bela versão de "Chão de estrelas é a que eu conheci e apresento para vocês, com a grande Maria Betânia, embora já tenha ouvido com o Sílvio Caldas. Mas talvez por não gostar de cantor que treme a voz, prefiro com a diva Maria Betânia. Ouça e acompanhe a belíssima letra.
Ah. Atenção para o poema que Betãnia declama no início da canção, do português Fernando pessoa. Tudo simplesmente belo!


Chão de estrelas
Orestes Barbosa

Minha vida era um palco iluminado 
Eu vivia vestido de dourado 
Palhaço das perdidas ilusões 
Cheio dos guizos falsos da alegria 
Andei cantando a minha fantasia 
Entre as palmas febris dos corações 
Meu barracão no morro do Salgueiro 
Tinha o cantar alegre de um viveiro 
Foste a sonoridade que acabou 
E hoje, quando do sol, a claridade 
Forra o meu barracão, sinto saudade 
Da mulher pomba-rola que voou 
Nossas roupas comuns dependuradas 
Na corda, qual bandeiras agitadas 
Pareciam estranho festival! 
Festa dos nossos trapos coloridos 
A mostrar que nos morros mal vestidos 
É sempre feriado nacional 
A porta do barraco era sem trinco 
Mas a lua, furando o nosso zinco 
Salpicava de estrelas nosso chão 
Tu pisavas os astros, distraída, 
Sem saber que a ventura desta vida 
É a cabrocha, o luar e o violão

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